quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Sou pirata. Saqueei um tesouro em tempos de crise.

Todos temos um pirata dentro de nós.
Sou pirata, de pala preta num olho e cicatriz num dos lados do rosto, fruto do combate que travamos contra a crise, por mares talvez nunca antes navegados. Qual capitão Gancho, qual quê? No meu mundo sou dos bons! Segui o mapa que descobri, por acaso, numa das gavetas do meu inconsciente, e de espada empunhada na mão, lutei com bravura - e ainda luto - contra monstros marinhos, governos e fiscais de finanças que se alimentam do nosso dinheiro. Fui ao leme do barco da vida a fazer contas de multiplicar e somar para o orçamento, ao final do mês, esticar.
E saqueei um tesouro só para mim. O de amor de um filho e de todos os que nos são mais próximos que não se compra com dinheiro algum. Apenas com o coração e muita dedicação. E com todo o tempo do mundo que possamos dedicar-lhes sem reclamar nada em troca, sem reclamar um tostão. Na arca deste tesouro guardo, a sete chaves, a fortuna que saqueei: os beijos, os miminhos, alguma dignidade e ainda coragem para dar a volta à crise. Mas, cuidado, que este é um tesouro que temos de alimentar para nunca ficarmos pobres. 
Sou pirata do meu mundo. E isso não tem preço. Não tem, não, por muitas contas de subtrair e multiplicar que façamos na gestão do orçamento familiar.
Mas todos ou quase todos temos uma nova cicatriz no coração de não sabermos que futuro iremos dar aos nossos filhos. De vermos o dia de amanhã enevoado, de vermos tantas injustiças por esse mundo fora e crianças sem amor de mãe e pai. Desafortunados sem teto para dormir, gente bem vestida, sem roupa rota e suja, a vasculhar o lixo alheio à procura de comida - já o vi – e vocês, de certeza, também. 
E todos os dias há quem lamente, numa casa bem perto da nossa, por não poder ir empanturrar-se no restaurante mais badalado da zona. Há quem choramingue ou bata o pé por ter o armário despido de roupa da última moda, a sapateira desprovida das botas do último grito ou não poder ver o concerto do artista X e Y. Ainda que, às vezes, até apeteça dar um grito de revolta e bradar aos sete ventos: “Vai-te embora, maldita crise! Vai com o vento para outras paragens! Não te queremos por aqui”. Mas ela é tão teimosa que, vejam lá, até simpatiza com todos ou quase todos nós. E até pede para ser nossa amiga no Facebook.
Mas, pensando bem, sou milionária de sentimentos. Tenho um tesouro que não tem preço, já o disse aqui.
Sou pirata e heroína do meu mundo. E todos temos um herói dentro de nós. Por isso, há que levantar todos os dias de cabeça erguida e exclamar sem pena de nós próprios: Que afortunados que somos. Temos um tesouro só para nós!...

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Quem quer plantar uma Gormiteira?



Os frutos que não se comem...
Cá em casa temos uma gormiteira carregada de tazos Gomiti, com os bons e os maus da fita da ilha de Gorm, da série televisiva Gormiti. Não é fruto que se coma, mas os olhos já os devoraram umas tantas vezes desde que nasceram naquela árvore. A sensação inicial é de estranheza por aqueles seres de tão pouca beleza natural à primeira olhadela e, como tal, não tão saborosos. Isso é o que parecia!... Mas, com o tempo aprendemos a saboreá-los como frutos exóticos e raros que são, porque são um tesouro para o nosso filho. Ele também coleciona os bonecos, mas isso fica para outro post.

Hoje dou comigo a pensar se apanho os ditos frutos dos raminhos, que já estão bem maduros, e que adornam uma jarra de papel de que tanto gosto, habilidosamente criada por pessoas com deficiência a quem deixo aqui todo o mérito. Ou se os deixo ficar para o meu petiz não ficar desiludido por danificar a gormiteira que ele plantou com tanto carinho e orgulho. Foi quando decorámos a árvore de Natal, "a árvore verde", como o meu filho a chama, com caezinhos peluche e outra tanta bonecada ao gosto dele que se lembrou de decorar os raminhos mais ao lado, tão despidos na altura. Escolheu os tazos com os Senhores da Natureza que lutam contra o mal e ainda os maus, é claro! Tínhamos que recriar a história!
Em minutos, furámos e pendurámos aquelas preciosidades.O rosto dele iluminou-se e apercebi-me logo de como as pequenas coisas, as mais banais, podem ser tão originais e fazer tanto sentido. Como o de fazer uma criança soltar gargalhadas depois de plantar uma gormiteira e querer ir a correr mostrar ao pai o seu feito.
O Natal já lá vai, mas a gormiteira é para ficar. É um acessório de decoração cá em casa, talvez o mais especial e original de todos. E porque não?...
Para quem não conhece os Gormitis: https://www.youtube.com/watch?v=58gRilufz6c

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

À espera que a vida aconteça

Às vezes parece que estou aqui à espera do momento em que a vida vai começar a acontecer. Deixo-me invadir pela inércia e fico a imaginar os momentos grandiosos que o futuro nos reserva. Em algumas ocasiões, chego mesmo a desejar que estes dias passem muito depressa, de forma a chegarmos rapidamente ao dia em que tudo vai fazer sentido e sejamos plenamente felizes.
Hoje, perdida num desses pensamentos tolos, sinto um puxão nas minhas calças e reparo surpreendida que o T se levantou sozinho. Contente com o seu feito, esbraceja até cair no chão novamente. Não faltará muito para andar sozinho.
Foi aí percebi que é o AGORA que importa. Nem sempre é fácil e há dias incrivelmente frustrantes! Mas há sempre um sorriso ou uma nova palavra. Cada dia, ainda que monótono, tem pelo menos um minuto fantástico. Isso há-de contar para alguma coisa, ou não?

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Filho, um amor eterno...












Sentei-me numa esquina envidraçada a deslumbrar as ondas do mar emaranharem umas nas outras, a entoarem um cântico que nos pacifica a alma e segrega mil e um desejos aos ouvidos. Fiquei a ver as ondas dançarem ao ritmo de um abraço e beijos gelados nos rochedos húmidos ali atracados sem terem como fugir. E fiquei ali a pensar como somos felizes quando vamos juntos ver o mar, quando brincamos de ancinho e balde na mão, e esculpimos castelos na areia molhada. Quando mergulhas os teus pezinhos de seda na água e regas os nossos com gotas salgadas enquanto soltas gargalhadas e a tua cara se ilumina como raios de sol. E como somos afortunados - ainda que sem tesouros dos piratas de que tanto gostas e sonhas -só por ver-te correr e pontapear a areia atrás das gaivotas que teimam em fugir de um abraço teu, e ver-te afundar apressadamente os teus graciosos dedinhos dos pés com uma queda ou outra pelo meio.
E digo a mim própria como somos felizes por sermos crianças contigo outra vez, por podermos pular e salpicar o corpo com areia como tu, meu Arcanjo, enquanto nos mostras o mundo pelos teus olhos!... E penso novamente como é delicioso ouvir-te exclamar: "Quero sentar-me ali a ver o mar!" E com um brilho nos olhos, sorrio com um sorriso teu, estico os dedos para carinhosamente afagar os teus caracóis de ouro e deliciar-me com o teu mágico "olhar de encantamento" como tu sabes bem fazer... E presenteio-te, ou melhor, presenteias-me a mim, com tantos miminhos e beijinhos que fico sem palavras, com coração sereno e com tanta paz de alma que, por minutos, me esqueço do mundo e dos problemas da vida!...O amor que um filho nos dá não se mede aos palmos. O amor por um filho pode tão bem ser assim!... Uma dádiva de Deus?...

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segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Ser Tiago em Santiago

São cinco da tarde e o sol desprende-se das nuvens que o esconderam durante quase todo o dia, dando à Cidade Velha uma luz dourada que a iluminará por exactamente cinquenta e seis minutos, até mergulhar decididamente no mar. De um lado, meia dúzia de miúdos chutam a água em frente aos barcos que já voltaram da pesca, aproveitando os últimos raios de sol de um dia quente de Novembro. Do outro, duas mulheres lavam roupa no mar e estendem-na nos calhaus. Ouvem-se as vozes das gentes que ao fim do dia se juntam na praça do pelourinho.
Estou sentada no Teruro di Kultura, um café com uma simpática esplanada naquela que foi outrora a primeira cidade fundada por portugueses a sul do Saara. Vim para fotografar, mas deixei-me invadir por uma vontade irresistível de olhar. Apetece-me ficar quieta a imaginar por onde terão entrado os piratas que saquearam a cidade nos séculos XVI e XVII. Ainda nem me sentei, quando os meus pensamentos são interrompidos por um choro miudinho que não tem nada de crioulo. O Tiago acordou e, com a autoridade dos seus seis meses, não parece disposto a partilhar a minha atenção com um pôr-do-sol que tinha tudo para ser avassalador.
 Viajar com crianças pequenas é mesmo isto. É perder “aquele” mergulho nas águas cálidas do Tarrafal, porque o sol está forte. É deixar fugir a Passadinha, porque ele se engasgou (ou não!). É não sair do carro na Serra da Malagueta, porque ele tem fome. É adiar para sempre uma conversa irrepetível, porque ele tem sono. É antever momentos únicos, passar-lhes ao lado e sonhar com eles ao adormecer se a noite for calma.
Mas não é só isso. É também ver os olhos dele brilhar ao molhar os pés no mar pela primeira vez, ali na praia de São Francisco, e a fechar-se enquanto passeamos ao longo da praia Gamboa. É descobrir sítios improváveis cada vez que suja a fralda e pessoas genuínas que nos acolhem com simpatia e generosidade. É partilhar a sua excitação com o primeiro banho de piscina e a sua serenidade ao ver o pôr-do-sol no bar do hotel Praia Mar, que, ainda que mais modesto que o da Cidade Velha, nos mostra a imponente ilha do Fogo a erguer-se por detrás da praia de Quebra Canela.
 E é ainda mais. É ajudá-lo a segurar na mão de uma menina crioula que nos segue durante quase uma hora no mercado de Sucupira. E vê-lo repetir a proeza dezenas de vezes com todos os outros meninos e meninas que vamos conhecendo nas ruas da Praia. Com o passar dos dias, é ele que tem que os ajudar a vencer a estranheza que mostram por nunca ter visto nenhum bebé branco. Como a Kelly da Calheta de São Miguel, por exemplo, ou a Natalina que costuma estar no Plateau com a mãe Gutu. A Kelly põe-se em bicos de pés para espreitar para dentro do carrinho e volta-se para a mãe, boquiaberta, fazendo tardar o “ajunta mô”. Enquanto isso, eu e a mãe dela conversamos sobre o aparecimento dos primeiros dentes e sobre a sua precoce aquisição de marcha aos sete meses. Já a Natalina, que vai fazer dois anos na véspera de Natal, é mais atrevida e quer passear o Tiago nas imediações do mercado, ou mexer-lhe nos pés testando-lhe o riso. Gutu, atrapalhada, pede desculpa pela filha, que vai soltando gritinhos de alegria. – Cá tem problema!, respondo-lhe eu procurando um olhar cúmplice.
 Viajar com o Tiago é descobrir o mundo enquanto ele se descobre a si próprio. É mostrar-lhe que, sozinhos, seremos sempre pequeninos. Por isso, devemos procurar um amigo em cada sorriso devolvido.

Imaginação. Precisa-se em dias de chuva...

Eram muitos, mas já foram!...

Imaginação? Precisa-se e muita em dias de chuva para entreter os miúdos para não ficarem molengões no sofá ou chutarem a bola contra a televisão e acessórios de decoração. Eles ainda se rebolam um bocado no sofá a ver um filme, mas não queremos crianças demasiado paradas, pois não? Ou a bugiganga em pedaços quando se lhes dá corda? O meu hall de entrada, de tão comprido que é, já se tornou o campo de futebol caseiro, a passadeira vermelha oficial para chuta daqui, chuta dali. “- Anda mamã, anda papá. Atira a bola!”, e lança uma gargalhada de tão feliz que está. E distrai-se como a emoção e lança a bola para a cozinha e lá vem ela bem alto: “Vês, mamã? magia!” E a culpa é de quem? Do frigorífico ou das panelas que esbarram na bola, ora essa…
Num destes domingos saiu-nos na rifa a pintura: o meu Arcanjo pintou um quadro com uma habilidade que é só dele, com o pincel na ponta dos dedinhos mágicos, astutos e tão vivos de imaginação. Ficou lindo e muito expressivo com a assinatura de um artista com apenas três anos. Ontem, a vencedora do dia foi a culinária. Com os seus ternos dedinhos e um olhar de quem sabe tudo, o petiz meteu a mão na massa e fez uns bolinhos de coco que fizeram as delícias da barriguita antes do jantar. Não se devia, eu sei… Mas ele tinha mesmo de os provar! Agora restam poucos e as migalhas, é claro!...

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Deixar a fralda a quanto obrigas…

Isto do chichi tem muito que se lhe diga! E o desfraldar também. Pode ser uma dor de cabeça quando toda a gente quer dar palpites mesmo que nem sequer tenhamos pedido. Ou se eles não estão preparados para isso, pois não é porque o primo, ou amigo de X ou Y já deixou a fralda que temos de obrigar o nosso a fazer o mesmo. Há que respeitar o ritmo deles. Eles até pedem!
Mas pode ser uma dor de cabeça quando eles insistem em marcar território em cantinhos da sala como se fossem um animal de quatro patas. Mas até aqui tudo bem. É normal, porque depois de meses e meses a fazer chichi e cocó na fralda, não é nada fácil mudar de um dia para o outro de rotina e, sobretudo, ter público na primeira fila a aplaudir ou a ralhar. Esta última não é nada aconselhada, porque os intimida ainda mais. Há que os incentivar: és capaz, que lindo, muito bem, palminhas!...
Isto de ir ao pote ou à sanita tem muito que se lhe diga, é verdade. Há quem, milagrosamente, se gabe de o garoto ou garota ter conseguido tornar o pote ou sanita o melhor amigo de um dia para o outro. Ui que sorte a deles que não tiveram de andar de esfregona numa mão e balde na outra umas tantas vezes ao dia para limpar o chichi ou de pano com detergente de cheiro intenso para tirar aquela fragrância do sofá que dias depois insiste em permanecer por lá. Ou se o pequenote, distraído com a brincadeira, fizer chichi na toalha de praia de uns amigos até as nossas maçãs do rosto corarem e sentirmos, imaginariamente, um buraco escavado na areia para nos enfiarmos lá… Ou fazer o dito cocó na cuequinha debaixo da mesa dos avós enquanto se janta? Quem é que nunca passou por isto ou ainda pior? Faz parte do crescimento deles e também do nosso. Nosso, sim, porque crescemos e muito… Já não nos envergonhamos com tudo isto e passa a ser o prato do dia ser apanhado desprevenido em qualquer situação mais constrangedora. Até que, realmente, de um dia para o outro, pedir para ir à casa de banho passa a ser tão normal como pedir uma bolacha ou iogurte. Eu cá preferi logo o redutor na sanita: mais higiénico e eles acham logo que são crescidinhos, porque usam a sanita como nós, os grandes. E até usam cuecas com os heróis de BD preferidos. Daqui a uns anos ou já nem nos lembramos de todo o frenesim ou vamos desatar às gargalhadas!

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Xixi

A coisa mais normal do mundo e não há ser humano ou animal de quatro patas que não o faça. Já o fizemos na cama em bebés, mais garotos e na velhice não sabemos e nem queremos imaginar o que nos espera. Vamos ao que interessa: bebés e quando é muito e vaza da fralda.
Lá vão os pais a meio da noite a esfregar um olho e a piscar o outro com a remela a espreitar, a bocejar de tanto sono, de não só ter de mudar a fralda, como o lençol e até o edredão quando a coisa corre mesmo mal. Quem é que nunca passou por isso? E se o bebé beber muita água ainda pior – o meu bebia e ainda bebe – então passa a ser rotina diária acordar de 3 em 3 horas ou menos com a criança aos berros a pedir água do biberão ou com a fralda tão cheia, tão cheia, que mudar é a única solução. De manhã o dia continua, trabalhar cheio de sono e com a cabeça tão distraída de cansaço que as ideias às vezes nem afloram.
Um dia, alguém me deu uma receita luminosa que ainda hoje - e o meu pequeno já tem três anos - uso religiosamente quase como prescrição médica. Aqui vai: duas fraldas uma cima da outra, mas a última um tamanho acima bem justinha. Muitas vezes, meto as duas do mesmo tamanho e a coisa até corre bem. Agora está muito melhor. As nossas noites de sono são maiores, não só pela receita, mas também porque ele está mais crescidinho. Nós agradecemos e a almofada também…